Advogado esteve em São Carlos para acompanhar mandado nesta sexta. Ele foi o 1º obter a autorização para entrega da substância contra câncer.
Uma corrida contra o tempo. Foi assim a sexta-feira (9) do advogado Dennis Cincinatus, que saiu de sua casa no Rio de Janeiro às 5h30 e, pouco mais de 10 horas depois, segurava nas mãos as cápsulas de fosfoetanolamina sintética entregues em São Carlos (SP). Ele conseguiu a substância experimental produzida na Universidade de São Paulo (USP) após obter uma medida cautelar do Supremo Tribunal Federal (STF) e saiu do campus com pílulas para três meses de tratamento da mãe, que tem câncer no pâncreas com metástase no fígado.00:00/03:19
“Estou bastante ansioso”, confessou ao chegar ao Fórum Cível de São Carlos, primeira parada na cidade. No local, ele confirmou que a decisão do ministro Edson Fachin já havia sido comunicada ao Tribunal de Justiça e deste à Vara local, responsável por fazer cumprir a medida. Também foi informado que a ordem havia sido encaminhada para a Central de Mandados e, ao chegar ao departamento, recebeu o apoio dos funcionários. “É uma alegria, a gente fica rezando pelas pessoas que vêm aqui em busca da substância”, contou a chefe do setor, Angélica Renata Tomazini.
Do Fórum, Cincinatus e o amigo Herbert Klinger Afonso Alencar foram para a segunda parada: o campus I. “Dá orgulho participar de tudo isso”, disse Alencar. “Queremos saber qual vai ser o desdobramento, queremos que a sociedade se mobilize, que as autoridades se mobilizem”, contou.
Em mãos
Autorizado pela juíza a acompanhar o oficial de Justiça na entrega do mandado, Cincinatus fez questão de ir à Procuradoria Geral da USP e saiu da sala com a assinatura do procurador e o alívio estampado no rosto. “Daqui a poucos minutos estaremos com a substância na mão”.
O último passo foi a ida ao Instituto de Química (IQSC), de onde eles saíram com 240 cápsulas. “Estou ansioso para chegar em casa e imediatamente passar para a minha mãe”, afirmou.
“Esses saquinhos simbolizam a vida, a esperança, a renovação do tratamento e a dignidade da pessoa poder ter um tratamento. Não têm preço, não têm preço. A vida não tem preço. Lamentavelmente, muitas pessoas não têm essa visão, mas isso aqui não tem preço”.
Outros pacientes
Enquanto Cincinatus apresentava o documento e retirava as cápsulas, familiares de pacientes e advogados chegavam à USP e saíam sem a fosfoetanolamina. Com a decisão do STF, eles julgaram que a universidade voltaria a fornecer o composto.
Fabiano Benvindo foi uma dessas pessoas. Ele foi à USP nesta sexta em busca de mais pílulas para o filho de 7 anos, que tem câncer no cérebro. “Ele começou a tomar e o tumor diminui de 3,8 cm para 1,7 cm”, contou apontando os números nos exames. “Mas ele tem cápsulas para só mais um mês”, completou.
Para tentar ajudar familiares como Fabiano, o defensor público federal Daniel Macedo informou ao G1 que está elaborando uma ação civil pública de âmbito nacional para que a portaria do IQSC seja suspensa e que a USP volte a entregar o composto. Ele afirmou que, nos próximos dias, quer reunir exames, documentos e relatos para, na semana que vem, entrar com o processo.
Entenda a decisão do STF
O Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu uma medida cautelar suspendendo a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que impedia o fornecimento da fosfoetanolamina sintética para uma paciente com câncer do Rio de Janeiro. Publicado na quinta-feira (8), o parecer abre precedentes para que outras pessoas consigam as cápsulas apresentando pedidos na instância superior, mas não é definitivo e ainda pode ser revisto.
A medida foi concedida após um pedido do advogado Dennis Cincinatus, que pedia a substância experimental para a própria mãe. Após ter a liminar para o fornecimento das cápsulas concedida em primeira instância, ele viu o pedido ser barrado no TJ e decidiu recorrer em São Paulo e em Brasília.
Nos pedidos, Cincinatus reforçou o direito à saúde, previsto na Constituição Federal, e obteve a decisão favorável do ministro Edson Fachin, que em seu parecer apontou também que a ausência de registro junto à Anvisa não implica em lesão à ordem pública e é um assunto pendente no STF.
Extensão
Segundo Alexandra Zatorre, que representa vários dos 742 pacientes que tiveram as liminares barradas no TJ até esta quinta-feira, advogados com casos envolvendo a fosfoetanolamina estão em contato e vão estudar a decisão do STF.
“Se ela não for aplicável a todos, acredito que vamos entrar concomitantemente e pedir a extensão do benefício liminar. Do mesmo jeito que a USP fez no TJ, faríamos no STF”, explicou, salientando que a decisão de Fachin é liminar e pode ser revista.
Outras esferas
Na última quinta-feira (1º), pesquisadores detentores da patente da fosfoetanolamina (ou fosfoamina) sintética se reuniram com o senador Ivo Cassol (PP-RO) e os deputados estaduais Roberto Massafera (PSDB-SP) e Rodrigo Moraes (PSC-SP) para discutir a apresentação da substância em uma audiência pública na Comissão de Ciência e Tecnologia (CCT).
Na sessão extraordinária da CCT realizada na manhã desta terça (6), foi definido que serão convidados para a audiência os pesquisadores e também Jarbas Barbosa da Silva Júnior, diretor presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), e Meiruse Sousa Freitas, superintendente de medicamentos e produtos biológicos da agência.
Em âmbito estadual, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) afirmou que iria avaliar o caso e o gabinete do deputado Rodrigo Moraes (PSC-SP) informou que foi marcada uma reunião com Nalini para pedir a revisão das suspensões. O encontro foi agendado para 26 de outubro.
Entenda o caso
Estudada desde o início dos anos 90, a fosfoetanolamina (ou fosfoamina) sintética era entregue gratuitamente no campus da Universidade de São Paulo (USP) em São Carlos, mas, em 2014, uma portaria determinou que as substâncias experimentais deveriam ter todos os registros necessários antes que fossem disponibilizadas à população.
Com isso, as cápsulas, que não têm a licença da Anvisa, começaram a ser distribuídas somente mediante decisão judicial. Pacientes com câncer obtiveram liminares estipulando a entrega, porém uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo passou a suspender as autorizações.
O que dizem as instituições
A universidade afirma que não tem capacidade para produzir a substância em larga escala e reforça que a regulamentação é necessária, mesma opinião da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica.
A entidade diz que não é contra pesquisas, mas aponta que, antes de novas substâncias serem oferecidas como medicamentos, devem passar por estudos amplos que comprovem seus benefícios e a eficácia diante do tratamento que já é oferecido.
A Anvisa, por sua vez, aponta que “não há nenhum processo de pesquisa clínica” para o produto e “não houve por parte da instituição de pesquisa nenhuma iniciativa ou atitude prática no sentido de transformar este produto em um medicamento”.
Fonte: http://g1.globo.com/sp/sao-carlos-regiao/noticia/2015/10/filho-busca-capsulas-na-usp-apos-liberacao-no-stf-nao-tem-preco-diz.html
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